Idas e vindas na hora do rush em São Paulo

Essa semana algo raro aconteceu: um terapeuta quântico me conduziu pela cidade.

Eu estava com dor. Muita dor nas costas. Eu praticamente nunca sinto dor. Tenho uma saúde de ferro. Herdei bons genes? Tenho um estilo de vida não muito radical? O fato de não ter chefe me ajuda a manter o estresse sobre controle? Não sei. Mas sei que não tenho nenhuma doença crônica — apesar do bruxismo me dar uns banhos de vez em quando — e que dor não faz parte da minha rotina diária.

O que significa que sou normalmente bem humorada, animada e regularmente paciente. Só que com dor, não deu. Fiquei irritada, mau-humorada, cansada — de tudo e da vida — e sem grandes paciências.

Normalmente sou das que entra nos taxis, ubers e cabifies e só tem coisa boa para falar.

Pelo menos 70% dos motoristas que já andaram comigo se comprometeram a se converter e abandonar o abuso de jornais, notícias e programas de TV, passar a praticar a apreciação e ver o lado bom da vida e falar mais de coisas boas e do que dá certo.

Me julguem como inocente mas metade do meu sangue é 115% otimista, acredita em tudo o que há de melhor na vida, na beleza, na música e na poesia. E a outra metade eu decido não alimentar e como ela fica com inanição, ela dá menos trabalho.

Mas esse dia foi difícil. Queria até mesmo reclamar, culpar os políticos, a crise, o FMI e estava a ponto de começar quando o motorista que me levava da Vila Mariana para o Itaim, em plena segunda feira hora de pico, disse:

“Veja que linda essa árvore! Essa é uma época muito bonita, acho que o inverno realmente terminou e daqui a pouco a primavera vai chegar.”

Na voz dele tinha tanto entusiasmo e apreciação genuína que eu não pude fazer nada além de acreditar. Olhei em volta e o carro estava tão limpo, arrumado, organizado… Até energeticamente falando, estava tudo no lugar. E disse:

“Sabe, normalmente sou eu quem falo dessas coisas, mas hoje estou com dor, e não está muito fácil apreciar tudo isso, assim, espontaneamente. Obrigada por me lembrar de ver.”

Ele me respondeu:

“Você já sabe a que veio a dor?”

Eu disse que sim, que sabia.

“Eu acabo aguentando muito, sem pedir arrego. Agradeço a essa dor, que veio me lembrar da hora de parar, depor as armas, pedir colo.”

E ele:

“Que bom que você já sabe, tomara que ela fique pouco tempo então, e que você tire as lições que tem que tirar.”

E ele passou a me explicar que o mundo era cheio de informações e que cada informação nova mudava algo dentro da gente, se a gente se permitisse. E que do ponto de vista da física quântica, isso e aquilo.

Era terapeuta quântico, o meu motorista. Terapeuta Quântico (e mil coraçõezinhos seguem essa constatação: sou fã de mecânica quântica).

Naquele momento, olhei para cima e agradeci. Obrigada meu Deus por ter me enviado esse terapeuta quântico/motorista/alma caridosa para me lembrar do que importa, com dor ou sem. Disse então ao motorista:

“Muito obrigada por ter aceitado o meu chamado. Não sei nem como te agradecer.”

Naqueles 10 ou 15 minutos naquele carro, eu tomei uns 12 passes ou me submeti a uma sessão tripla de Reiki. Parece que entrei em uma dimensão e saí por outra. Só de pensar nisso, me reconecto com a paz que senti naquela conversa no meio de uma São Paulo corrida de uma segunda-feira hora do rush. Ele me disse que só entrava gente abençoada naquele carro e que estava tudo bem. Que só existia paz.

E eu acreditei… E acredito até agora, mesmo com a dor nas costas que persiste, que só existe paz.

Banalidade ou recado do universo? Resignificando encontros casuais na cidade

Tenho uma teoria sobre o pertencer a um lugar, ou a uma cidade. Se sabe que pertence quando, um belo dia, sem mais nem menos, se encontra um conhecido na rua.

Foi assim em Miami. Eu era estagiária em um programa de intercâmbio internacional. Fora de lugar, fora de mim mesma (tinha acabado de tomar um fora de namorado da estação) e longe de tudo. Fui até o aeroporto buscar um amigo e encontrei minha primeira conhecida, por acaso: minha professora de inglês que estava levando o filho (ou buscand

o o marido?) ao aeroporto. Assim, sem mais nem menos, escuto Barbara e vejo a Barbara (também era o nome da minha professora de inglês).

E pimba, eu soube que tinha chegado.

Encontrei meu primeiro conhecido na rua. Foi assim em todos os lugares onde eu morei, Madrid, Helsinki, Londres, Bruxelas. Genebra não conta pois os Unocratas todos circulam nos mesmos lugares então, fatalmente, iríamos nos encontrar. Mas em Wageningen, minha segunda casa, também foi assim há uns 2 meses, encontrei uma aluna na rua e uma amiga do meu marido gritou meu nome desde um restaurante em seguida. Aí eu soube: cheguei.

Aconteceu comigo em São Paulo e essa foi uma revelação: essa semana encontrei duas amigas no supermercado (tudo bem, a gente mora no mesmo bairro) e outra conhecida no Parque, de manhãzinha. Um dia depois do outro. Para mim foi um sinal: agora eu pertenço a São Paulo. E isso é estranho. É estranho porque há alguns dias conversava com um colega sobre a vontade de me mudar daqui. Do quanto era complexo me adaptar ao ritmo e à energia da cidade, que nunca para, que é densa, materialista, anônima.

Daí eu volto e encontro não uma, nem duas, mas três pessoas conhecidas. Assim, sem mais nem menos. Meu Deus! Será isso um sinal? Agora não apenas pertenço mas São Paulo tem algum tipo de direito de posse sobre mim?

Até que não seria ruim. Há coisa melhor do que se sentir em casa, onde estiver? Ainda mais para quem já rodou por aí e se sente mais em casa fora de casa que na própria cidade?

We shall not cease from exploration, and the end of all our exploring will be to arrive where we started and know the place for the first time.
T. S. Eliot

Será que é isso que acontece com a gente? Primeiro a gente roda o mundo e se sente em casa em tudo quanto é lugar e, quando para de resistir, começa a se sentir em casa no seu próprio país, na sua própria família ou na sua própria comunidade?

Desde que saí de Belo Horizonte aos 17 anos, nunca mais me senti plenamente em casa. Antes, eu amava aquela cidade mais que tudo. Era o lugar mais bonito, mais perfeito, mais aconchegante, florido, sorridente, misterioso… Daí fui ser intercambista e parece que a minha alma cindiu-se. Um pedaço ficou na Bélgica e nunca mais voltou. Talvez as tradições indígenas conseguiriam explicar isso, no xamanismo se explica a cisão da alma, de forma até bastante elaborada. E trabalha-se na reconexão, na jornada de reencontro com a alma perdida.

Bom, com alma perdida ou achada a verdade que encontrei conhecidos em SP e a sensação foi incrível. Ainda mais porque parte dos encontros só se deu porque tinha uma galera dirigindo muito devagar na minha frente durante todo o trajeto de ida ao supermercado.

Xinguei, buzinei, reclamei. Mas ainda bem que no trajeto havia tantos motoristas a 30km por hora. Ou não teria encontrados meus amigos e escutado de São Paulo: “Você me pertence”.

Já era hora, né, São Paulo? São 8 anos de namoro, idas e vindas, noivado, ruptura e reconexão. Se a pergunta é: “Você me aceita?”, eu digo “Sim!”.

E você, pertence a onde?